O problema das estatísticas é não suscitarem emoções: são apenas números. A maioria dos cidadãos não se interessa e os governos podem facilmente ignorar esses números. Se não, vejamos — os mais recentes dados do Instituto Nacional de Estatística apontam para uma taxa de pobreza de 44,8% em 2016, que passou para 45,7% em 2017, sendo 17,7% maiores de 65 anos. Estes dados divulgados pelo INE mostram que as famílias constituídas por dois adultos e três ou mais dependentes são mais atreitas à pobreza. Para a população em geral, a taxa de risco de pobreza é de 17,3%.
Debelar estes números deveria ser a base de um pacto de regime, deveria ser o grande desígnio dos nossos governantes. Ora, como se sabe, não é isto que os move. E, no entanto, se os governos não se ocupam activamente com o bem-estar das populações, para que servem os governos?
Mas, afinal, estas estatísticas de pobres referem-se a desempregados? Não! Na sociedade que criámos, ter um emprego a tempo inteiro, por vezes de violento trabalho braçal de 12 ou 14 horas diárias, 6 dias por semana, trabalhando para patrões generalizadamente desonestos para com as leis laborais, não significa deixar de ser pobre. Quase um em cada dois portugueses vive esta ultrajante e injusta realidade. A falta de dinheiro ocupa e condiciona dramaticamente a vida de muitos de nós.
Francisco Silva, Dirigente Sindical da Direção Regional do Oeste |
Um pouco acima desta linha estatística que define a pobreza, ficam os remediados, os quase-pobres, talvez os mais frustrados. São cultos, sabem que o mundo existe, mas não o podem alcançar. Por exemplo, um casal de professores a meio da carreira, um colocado no distrito de Viseu e outro no distrito de Leiria, que, quando lhes é atribuído um horário completo, vêem depositados mensalmente 1300 euros em cada conta da CGD. As deslocações, os carros, as duas rendas de casa, reduzem-nos a igual desespero para pagar contas. Este casal não poderá proporcionar aos filhos o que recebeu dos seus pais. O elevador social destas famílias, em vez de as levar a um terraço com vista, leva-as ao -1 ou -2.
Quando, numa situação limite demasiado frequente, alguém se vê reduzido a ir buscar os sacos da ajuda alimentar, desce abaixo daquela linha crítica de dignidade. Rebaixa-se. Passa a viver numa revolta indizível acrescida da angústia de não ter a certeza de que na próxima semana o saco com as vitualhas lá esteja.
Estes milhões de pessoas têm razões de sobra para a revolta. A injustiça social é evidente, pois o engrossar das grandes fortunas manteve-se imparável durante a crise. E, pior, a percepção da corrupção também aumentou. Apesar de o desemprego ter vido a baixar, a precariedade e os salários miseráveis mantêm-se. A globalização do trabalho sem direitos e a ordem ultraliberal de subfinanciamento dos serviços públicos imposta por Bruxelas atinge duramente Portugal. Facilmente se percebe que pode haver revolta activa, além da depressão ou do conformismo.
Se os políticos não conseguem fornecer o que se espera deles, culpa-se a democracia e cresce a abstenção, aumenta o desinteresse pela política, desenvolvem-se movimentos marginais. Quando os defensores da democracia não querem perceber que, em grande parte, são as suas más políticas que destroem o regime democrático, abrem espaço aos populismos, que surgem da convicção de que serão outros métodos, não os institucionais, que resolverão os problemas. Por causa da inépcia dos governos em debelar ou sequer reduzir a pobreza e a precariedade, Portugal será também atingido pelas vagas antidemocráticas e populistas que assolam vários países da Europa e das Américas. Portugal assistirá, em breve, à chegada ao Parlamento de grupos políticos de extrema-direita, representando frações significativas de eleitorado. Nessa altura, a sociedade portuguesa agirá no sentido da explosão populista ou no do receio de quem não quer perder o pouco que tem?
POR Um SPGL ainda mais FORTE
Francisco Martins da Silva
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